"Mankind Is No Island" é o título do filme que ganhou o Tropfest NY 2008. Tem a duração de três minutos e meio.
O Tropfest é o maior festival de curtas-metragens do mundo. Começou há dezassete anos em Sidney e teve a sua 1ª edição nova-iorquina no ano passado. O trabalho vencedor de 2008 foi totalmente filmado com um telemóvel em Sidney e Nova Iorque por Jason van Genderen.
O seu orçamento foi de quarenta dólares americanos.
E mais não digo porque as imagens valem mais que todas as minhas palavras.
Às vezes acontece, muitas coisas sem relação alguma encontrarem-se num ponto comum.
O vídeo abaixo é um desses casos, numa interpretação pessoal, claro. Mas o que é a vida, senão pessoal?
(...pausa para porem a tocar...)
A belíssima melodia foi evidenciada pelo filme Closer (Mike Nichols, 2004), que a Cosmo já referiu aqui e aqui. Um filme que nos impressionou porque aborda questões complexas do amor e da sexualidade sem cair nos facilitismos do julgamento moral, com uma profundidade terrível, despida, invulgarmente realista. Uma perspectiva rara, portanto.
Agora Seu Jorge e Ana Carolina, aquela que comeu a madona, dois brasileiros cujas carreiras artísticas sempre tive pena de não conhecer (nem bem nem mal), apresentam-se-me juntos interpretando a canção de Damien Rice e colando-lhe uma letra com ADN brasileiro, enchendo-a assim do calor tropical e sensualidade que faltaram ao intérprete original.
Para vos dar uma ideia que quão alheada eu posso ser em relação à chamada "cultura lésbica", até ontem à noite nunca tinha ouvido falar num filme chamado "Gia", em que Angelina Jolie desempenha o principal papel, representando uma top model fora de série e lésbica, afinal o sonho molhado da maioria das mulheres atraídas sexualmente por outras mulheres.
A película é baseada numa história verdadeira, ou melhor, numa pessoa que existiu mesmo. Essa mulher, Gia Maria Carangi, encantou as passerelles no fim dos anos setenta e primeira metade dos anos oitenta do século passado, tendo sido toda a sua vida adulta objecto de explorações várias, inclusivé as decorrentes de uma forte dependência de drogas duras, tendo sucumbido aos vinte e seis anos de idade, em 1986, vítima do flagelo da SIDA.
Pois bem, ontem à noite, num canal que se Chama "Fox: Next", do qual também nunca tinha ouvido falar até ter recentemente instalado o Meo, deleitei-me com um verdadeiro festival estético, tão estético quão bonita pode ser uma mulher em cada detalhe físico seu. E horrorizei-me com a armadilha que a beleza extrema pode constituir, não no sentido de ser à priori prejudicial ser-se bel@, muito menos no sentido de uma alusão demoníaca da beleza, tão clássica [a alusão] afinal, porque não é nada disso, nem neste caso as portas que a extraordinária beleza lhe abriu e o que lhe proporcionou foram o que a foi matando aos poucos, mas sim a ilusão de poder que ser bel@ dá a alguém, a essa pessoa e só a ela própria, uma tentação irresistível de cair na falácia de se achar sobrehuman@, impermeável a inseguraças e outras fragilidades, uma noção fantasiosa de domínio e influência muito perigosas para ela, mas também para quem lhe é emocionalmente próximo. Porque, se parece que toda a gente quer as pessoas belas, que toda a gente as solicita, alimentando-lhes o ego e a auto-estima, a realidade é que a grande maioria das pessoas apenas as quer possuir para alimentar o seu próprio ego, usá-las e deitá-las fora assim que aparece um melhor sucedâneo.
No fim, toda a gente se lembra dela, mas raros são os que vão sentir a sua falta e é este o epílogo de uma vida infeliz.
Parece impossível para quem me conhece bem, mas há meses que não ia ao cinema.
Na passada segunda-feira decidi ir ver um filme com F grande. Das películas todas que havia em cartaz, uma destacou-se pelo tema, um quadro magistral e controverso, e pelo realizador, o genial Peter Greenaway, um dos meus realizadores de culto.
O próprio Greenaway teve formação em artes plásticas e salta aos olhos como esse facto influenciou a sua forma de filmar.
O filme poder-se-ia resumir assim: uma personagem dentro de um quadro em cima de um palco captado por uma película. A noite e a luz, a cegueira e a revelação, a construção, o caminho até à obra-prima. Uma interpretação arrojada, de uma estética assombrosa, da vida e obra de Rembrandt.
Estou curiosa para ver como é que a relação entre as duas mulheres é retratada. Já se sabe que Soraia Chaves representa um papel de prostituta de luxo. Mas quão "prá-frentex" é que o cinema português de facto está? Será mais um retrato machista e/ou homofóbico do lesbianismo? Uma relação lésbica meramente comercial? É o que vamos ter de aguardar para verificar. Aqui pode ver-se um trailer do filme (só para subscritores do You Tube maiores de idade).
Como já aqui disse, não sou muito dada à continuação de correntes, mas a esta não resisti. Foi lançada pela Frioleiras e transmitida ao Azinhaga pela Nnannarella. Consiste em nomear cinco filmes máximos e passar a outros blogs. Mencionarei mais que cinco e, mesmo assim, tenho a certeza de que me lembrarei entretanto de muitos outros. Passo a corrente... a mim própria, que a lista não se esgota aqui.
Dividindo-os por temas, escolho então os seguintes, para filmes máximos:
Tóquio é a cidade ideal para se estar deprimid@. Pressinto isto desde o Lost in Translation, essa obra cinematográfica discreta, magistral e demonstração plena do tal ideal. Em Londres e outras cidades cinzentas sente-se frio e outros desconfortos, mas também uma excitação cosmopolita que é antónima de depressão. Em Tóquio não se percebe nada do que se lê, não se compreendem os discursos, a cultura, os gestos. Mergulha-se na desorientação total e na procura desesperada de uma pista de sentido que nos oriente para um conforto minimal. Em Tóquio não se sente nada de positivo pela cidade, portanto não se tem pena de passar o dia todo encafuad@ num bom hotel. Há espaço de sobra para a depressão, amplo, digno e com estilo. Há também motivos e argumentos para side effects como o escárnio, o choro, o desprezo, a auto-comiseração e a apatia. E nem precisa de estar a chover. Aquele manto de poluição entre nós e o céu serve lindamente. Alguém tem um bilhetinho de avião a mais?
... em que a realidade não é conciliável com a actualização regular do blog. Esta seguirá dentro de momentos, que podem ser mais ou menos longos. Mas para não vos deixar completamente a seco, querid@s leitor@s, recomendo uma visita atenta a dois blogs: Blindness, da autoria de Fernando Meirelles, realizador de filmes como "A Cidade de Deus" e "The Constant Gardener". Este blog é um diário das filmagens da sua nova longa-metragem, baseada no livro de José Saramago "Ensaio Sobre a Cegueira". Muitíssimo interessante.
Outro é o blog de Lucía Etxebarría, Una Blog Como Otra Cualquiera... . Para quem, como eu, é fã desta escritora espanhola. Quem não é ou não conhece, pode ter sempre a abertura de espírito necessária para se deixar surpreender.
Ainda ontem, sem saber que falecia, tinha estado a escrever um (futuro) post em que mencionava, entre outros, este notável realizador. Lembro-me de, na adolescência, quando passavam ciclos de filmes dele no cineclube de Lourenço Marques, me considerarem uma espécie de herege por não gostar de todas as películas sem restrições. Não gostava e ainda hoje não gosto. Como, salvo raras excepções, não gosto de todas as obras de outros realizadores, escritores, pintores, etc. Mas há alguns dos filmes de Ingmar Bergman que me marcaram para sempre. Gostei especialmente de Morangos Silvestres, A Fonte da Virgem, O Sétimo Selo, A Flauta Mágica, baseado na ópera de Mozart, e O Ovo da Serpente, que é absolutamente magistral (e tão actual ainda!). Marcou-me em especial, um filme dele que se chama Cenas da Vida Conjugal, de 1973, do qual o Woody Allen fez um remake menor. Esse filme aborda o adultério, o divórcio subsequente do casal, ressentimentos e traumas inerentes, mas também, ao longo do desenrolar da história, as cumplicidades, a amizade e o amor profundo alicerçados nos dez anos de união dos dois personagens. Numa entrevista sobre o filme Saraband, realizado 30 anos após o Cenas da Vida Conjugal, do qual é a continuação, o seu actor de culto Erland Josephson afirma o seguinte, a propósito desta pergunta que lhe faz o jornalista: “Muitos realizadores tornam-se melancólicos e condescendentes com a idade. Bergman, pelo contrário, parece mais duro e pessimista do que nunca a respeito das relações sentimentais e familiares. Concorda?” “Sim, mas há esperança no meio desse pessimismo e dessa amargura. O que Bergman diz em Saraband é que é muito difícil falarmos uns com os outros, abrirmo-nos uns aos outros, mas temos que continuar a tentar, tentar sempre. E essa tentativa é, em si, uma manifestação de optimismo.” (Fonte: DN Online)
Numa época em que as relações monogâmicas de longa duração estão em crise, a mim, que sempre acreditei nelas, apetece-me destacar estas obras, que as enaltecem. Obras que um génio sensível, um clássico romântico, nos deixou num precioso legado.
Michelangelo Antonioni (29/09/1912 – 30/07/2007)
Viaja no mesmo dia que Bergman. Parte para outro sítio não palpável que não é a terra dos mortos, porque nenhum deles morrerá de verdade. Isto é apenas uma formalidade. Um check-out. Uma escala entre voos. Representante incontornável da época de ouro do cinema italiano, Antonioni realizou também filmes que me acompanham na minha própria viagem. O Deserto Vermelho, A Noite, Le amiche , Blow-up , que é um filme extraordinário, etc. Também me entediava de vez em quando com os seus longos planos sem diálogos, mas no fim prevalecia uma sensação de beleza. Como Bergman , embora cada um à sua maneira, é um realizador que foca bastante a crise dos sentimentos e as dificuldades de comunicação da sociedade burguesa, que retrata de forma por vezes impiedosa. Foi a sua forma de tentar ajudá-la a melhorar. E eu acho que conseguiu, através de uma obra que engrandece a Humanidade.
Era um dia chuvoso que intensificava os odores e tornava o ambiente triste e poético. Mesmo ao meio-dia, os candeeiros a óleo continuavam acesos, fazendo parca frente a um céu de chumbo que se sustinha ameaçador um pouco acima das nossas cabeças. Os planos passavam por ir dar uma volta pelas redondezas, mas o táxi faltou e o tempo estava tão agreste que resolvemos abrigar-nos um pouco no único café aberto, aliás, o único café existente, que era também pensão, restaurante, e provavelmente a desoras, resguardo para encontros íntimos nos quartos do primeiro andar, mas isto pode ser só uma provocação do meu imaginário.
No chão do café saltavam sapos nos cantos contra as paredes, buscando uma saída que teimava em não se lhes revelar. Desejei que os tirassem dali, que me metiam um asco incontrolável, embora não parecessem incomodar mais ninguém e até divertir muito a minha irmã, que os caçava à paulada com um cajado que tinha tirado não sei de onde.
Um homem magro, muito moreno e de faces chupadas, vestindo um capote cinzento com uma pele de coelho à volta do pescoço acenou-nos de uma mesa e o meu pai disse-nos que aquele era o António, dêem-lhe um beijinho, filhas, o António e a Margarida fazem filmes de cinema. As bocas abriram-se-nos ligeiramente quando os olhos estacaram nuns aparelhos espalhados pelo chão aos pés da mesa. Máquinas de filmar, cabos e tripés, coisas que só tínhamos visto na televisão. Aquilo aliás, era com o que se fazia a televisão.
Só muito mais tarde me apercebi quem eram o António Reis e a Margarida Cordeiro, que se cruzaram diariamente connosco durante aqueles dias na escada da casa de Bemposta, sorrindo, fazendo-nos festas nas cabeças como as faziam aos cães, ou ignorando-nos por completo, enquanto dirigiam as filmagens de “Ana”, considerado entre os 25 melhores filmes do último quarto do século XX.
Creio, aliás, que após esse encontro, não saímos mais das escadas, eu e a minha irmã, esse corredor fascinante, por onde passavam os actores, os técnicos e outros desconhecidos, subiam e desciam holofotes, se fumavam os cigarros da concentração e se discutiam cenografias, técnicas de som e planos artísticos. Nessa película se entrevê esta casa de que vos falo, esta terra inóspita, e se é presenteado com a poesia visual da dupla Reis / Cordeiro, essa gente ilustre de um lirismo tão tocante quanto era profundo o seu amor a Trás-os-Montes.
Hoje, a feérica iluminação pública, os transportes, as auto-estradas e toda essa máquina que é o progresso terão alterado aquela paisagem para sempre e feito bem às populações antes entrincheiradas no isolamento, mas às minhas memórias devastá-las-iam, pelo que não quero, não vou, não volto. São minhas e gosto delas assim, enevoeiradas, húmidas, a cheirar a fumo de lareira antiga, com sapos a saltar-me aos pés, com terror dos cães prontos a atacar-me ao virar de cada esquina, cheias de fantasmas e medos e risos e fábulas. Passaram três vertiginosas décadas entretanto, anos que mudaram tudo, todas as perspectivas, todas as vivências. Mas dentro de mim, num canto recôndito, aquele mundo ainda existe.
Não que eu defenda ou sequer pratique moralismos excessivos em relação à verdade, que para mim sempre foi gritantemente relativa, mas devo confessar que não me agradou ler e não me rever, agora, assim a frio.
De facto, "keep it simple" não é "o meu lema de sempre", como estava lá escrito. Nem sequer é o meu lema, porque eu não me lembro de ter lema nenhum em altura alguma da minha existência consciente por mais de dez minutos seguidos, portanto se o tive, foi na outra. "Quero mais papa e não gosto de brócolos", ou assim.
"Keep it simple" é apenas a forma como eu gostava que a minha vida fosse e mesmo assim numa concepção meramente teórica, como num filme de há uns aninhos do Joaquim Leitão chamado "Uma vida normal" em que paradoxalmente o actor no papel principal luta com desespero para ter uma vidinha menos complicada, mas cativa o espectador precisamente pelas suas acidentais e sedutoras aventuras. Aliás, provoca-lhe inveja. Ao espectador. Espectador esse que tem, em 99,99999999% dos casos uma vida tão desprovida de emoção que o que deseja mais ardentemente é introduzir-lhe uma certa entropia mas só se for com estilo. E se não se partir todo nem for obrigado a declarar falência. Enfim, querias! Como eu queria que a minha cabeça fosse tão simples como a minha vida, ou que a minha vida fosse tão excitante quanto a minha imaginação.
Esparta, séc.V a.C.. Leónidas, o rei, fantasia sobre a sua infância violenta enquanto cofia a barba egípcia.
Rufia por natureza, decide convocar a guerra com o rei dos Persas, Xerxes, um andrógino sanguinário com muito mau feitio, que apesar do seu assinalável jeito para se vestir de mulher, padece de gigantismo.
Esta decisão não é bem aceite, nem pelo Conselho da cidade-estado, que como um qualquer parlamento, acha que tudo o que não tenha seu iluminado aval está mal feito, nem tão pouco por um bando de leprosos que residem isolados no topo de um rochedo, a quem toda a gente se esqueceu de informar que já estão mortos há algum tempo, que para passar o tempo fazem porcarias à vez com uma adolescente drogada e, last but not the least , se autoproclamam "o oráculo".
Mas Leónidas, o machão, entediado com a sua vida sexual e saudosista de uma boa refrega, lá reúne, à revelia, 300 rambos arcaicos, que além do elmo, da lança, da espada e do escudo, envergam uma elegante capa rubra e umas cuecas Calvin Klein.
Depois de gritarem muito alto "AÚ! AÚ! AÚ!" numa coreografia patética, lá se põem a caminho, não antes de a rainha, simbolicamente oferecer um corno a Leónidas.
A partir daí o estimado espectador será brindado com uma profusa (e interminável) sequência de freak-shows compondo um imenso espectáculo sado-maso onde não faltam montanhas de mortos cobertos de moscas, mamutes suicidas e répteis com falta de equilíbrio, chuvas de setas sincronizadas digitalmente, um exército de mascarados que são conhecidos como "os Imortais", nitidamente recrutados no carnaval de Veneza e que tentam respirar como o Darth Vader, decapitações em movimentos copiados do Matrix, muita caracterização comprada de certeza nos saldos de fim de época dos adereços do Senhor dos Anéis, e obviamente, como não podia faltar, um Judas na pele de um corcunda desfigurado, que em troca de um chapéu papal, mas preto e com estrelinhas, trai os 300 de Esparta, expondo a falha da sua estratégia, que os 300 000 000 persas não tinham chegado para descortinar antes.
Cai finalmente o primeiro espartano, com muita elegância, diga-se de passagem, num movimento perfeito de queda sobre os joelhos para depois se deixar deslizar para o lado direito em câmara lenta, estendendo-se finalmente no chão com uma delicadeza impressionante, pelo menos para alguém que já tem a cabeça separada dos corpo há uns minutos.
Entretanto a rainha, metendo-se onde não é chamada, acaba por ter que dar uma de borla ao intriguista ambicioso lá do burgo que promete apoiá-la no seu discurso perante o Conselho, onde esta acaba por lhe cortar os tomates quando ele se começa a vangloriar em público de a ter comido, alegadamente para desmentir a sua fama de impotente.
Um vigia vem avisar Leónidas que estão cercados, ao que este manda toda a malta embora para ficar só ele e mais uns aficionados do S-M debaixo da mira de Xerxes , que obviamente fecha os olhos à debandada, e fica por explicar como é que aquela maltosa toda ultrapassa o cerco incólume.
Leónidas encomenda ainda a um espartano cegueta o relato desta bela história no Conselho e a devolução do corno à rainha.
Depois, prepara-se para morrer com todo o dramatismo, não sem antes desfigurar Xerxes num impressionante lançamento do dardo que ficaria na história como precursor de uma das mais enigmáticas modalidades dos Jogos Olímpicos de Atenas, constando ainda hoje como o recorde do mundo, uma vez que estamos a falar de um lançamento de 500 metros.
Em resposta, mais uma chuva de setas, desta feita muito mais eficaz, que mata os espartanos todos, inclusive Leónidas que ainda tenta dizer "AÚ! AÚ! AÚ!" mas não consegue por ter uma seta cravada na laringe, portanto opta por delirar com a sua querida.
Um plano superior revela-nos uma composição de corpos mortos, num estilo trágico-barroco muito ensanguentado, com Jesus Cristo, perdão, Leónidas ao centro na posição de crucifixo, mas na horizontal e com setas.
A rainha recebe o pingente em forma de corno e passa esse precioso testemunho ao filho.
FIM.
300: uma fantástica épico-chachada com pretensões pictóricas e sem a noção do ridículo. Não perca, num cinema perto de si.
Em noite de Óscares da Academia, veio-me à memória esta fotografia que tirei em Hollywood Boulevard em Fevereiro de 2005.
Por essa mesma altura, George W. Bush tinha conseguido a sua reeleição para Presidente dos EUA, mais especificamente, no fim do ano de 2004.
Em resposta aos movimentos cívicos contra as políticas da Administração Bush que se multiplicavam em Hollywood, alguém (uma "organização de cidadãos") decide, provavelmente com o patrocínio da Casa Branca e/ou do Governo Estadual da Califórnia, fazer esta "pequena provocação", que em minha opinião diz tudo sobre a prepotência, a arrogância e a mentalidade fascista de Bush.
Expondo desta forma nomes (e caras) que lutaram contra a sua reeleição, como Michael Moore, Whoopi Goldberg, Barbra Streisand, Sean Penn, entre outros, a questão política é transformada numa guerra pessoal e é transmitida uma mensagem que pretende ser intimidante: Still President. Thank you Hollywood."
Isto é de tão mau gosto que francamente só me lembra rituais medievais de caça às bruxas, de fogueiras em praça pública, de humilhação do inimigo no seu território. O princípio é o mesmo, a mentalidade é a mesma, os métodos é que são um bocadinho mais sofisticados. Mas já não se usa. A não ser por gente como Bush.
Dois anos depois, na 79ª edição dos Academy Awards, filmes e documentários como "Babel" e "Uma Verdade Inconveniente" estão distinguidos com nomeações e Ellen DeGeneres, cicerone da Cerimónia de Entrega das estatuetas douradas, faz constantes referências, logo na sua primeira intervenção, em tom irónico, mas não menos acutilante, às questões de descriminação de raça, credo e orientação sexual, assim como à questão das eleições viciadas, referindo-se especificamente à derrota de Al Gore na corrida à Casa Branca aquando da primeira "eleição" de George W. Bush. E porquê? Porque estas referências estão em todo o lado. São incontornáveis. Estão nos filmes, na Academia, nas ruas, nas mentes dos americanos. Cada vez mais, e mais fortes.
Parece que o obscurantismo patente em propagandas como aquela do cartaz já não podem vingar, e se começa a vislumbrar um novo ciclo. "The Times They Are A Changin '".