Acabei de assistir à entrevista que a Judite de Sousa fez ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Dr. Noronha do Nascimento. De sublinhar da parte desta, o péssimo e tendencioso jornalismo, a má criação quando gesticulava de óculos em riste, o corpo inclinado para a frente, os olhos coruscantes e acusadores, o tom autoritário e agressivo, as interrupções constantes ao que o entrevistado respondia, o desagrado e falta de respeito quando as respostas não eram as que queria e a ausência de neutralidade jornalística e política, que foram uma constante. Até parecia um julgamento em que o acusador fazia cair sobre o réu uma chuva de perguntas, não lhe dando sequer a oportunidade de se defender.
Gostei do que disse e como disse o Dr. Noronha do Nascimento. Com toda a seriedade, a explicar, quando a outra o deixava, como funcionava a justiça, as instituições e como se relacionavam as diferentes hierarquias e competências dentro delas, nomeadamente no que lhe dizia institucionalmente respeito. Recusando-se sempre a fazer juízos de valor. Indignado muitas vezes por que ciente de que questionavam o seu bom nome. Para lhe tentar mostrar que era pelo menos tão idóneo e independente como os juízes de Aveiro. E que a independência dele não podia ser posta em causa só porque ele não tinha actuado como alguma comunicação social queria.
Acho que convinha lembrar que “Segredo de Justiça - É a regra segundo a qual, aos sujeitos processuais não interessados ou a terceiros, é legalmente proibido conhecer o conteúdo dos actos e diligências praticados no processo. A tópica "segredo de justiça" é inseparável do princípio da publicidade – a outra face da moeda. Em processo penal, o segredo não tem por finalidade ficar oculto mas antes pelo contrário trazer à luz aquilo que se desconhece.
Numa concepção técnico-jurídica de instrução criminal, o segredo de justiça baseia-se em motivos de carácter técnico processual: o seu fundamento reside na garantia de investigação de forma a evitar "que o culpado conheça as pistas de instrução e possa frustrá-las", confundindo a acção da justiça.
O segredo é necessário para impedir que desapareçam as provas do crime, para recolher e inventariar os dados e para comprovar a sua existência. Para o processo pode ser prejudicial o conhecimento, por terceiros, de algum ou alguns desses actos, que conduziriam ao resultado final, frustrando-o. A publicidade do acto anterior pode tornar inútil o subsequente, levando ao desaparecimento das provas.
Aponta-se também dentro dos fundamentos técnicos processuais do segredo de justiça, a necessidade de repor a igualdade das forças – Estado/arguido. Este, ao praticar o crime, fê-lo de modo calculado, sub-repticiamente, colocando-se em situação de vantagem. Para repor a igualdade das forças em oposição, numa primeira fase, o Estado (tal como faz o arguido), actuará sob sigilo. Pois diz-se que o segredo é uma razão de eficácia.
A par dos fundamentos técnico processuais, importa considerar a honra do arguido. Este goza do direito fundamental ao bom nome e reputação e de garantia de presunção da inocência. Daí justificar-se o segredo de justiça, impedindo que a reputação alheia sofra mácula pela divulgação de notícias falsas susceptíveis de causar prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação, se, afinal, não ficarem provados os factos sob suspeita.
O segredo de justiça usa-se assim, como se vê, para proteger o interesse do Estado na realização de uma justiça isenta e independente pretendendo-se com a sua aplicação: (a) Evitar intromissões sensacionalistas e especulativas que perturbem a investigação; (b) Não prejudicar o interesse do arguido publicitando factos não provados; (c) Evitar que o arguido tente subtrair-se à acção da justiça ou perturbe a investigação.”
Ou seja, tudo que se pretende evitar com a aplicação do segredo de Justiça está a acontecer e as pessoas visadas são, à partida, sem apelo nem agravo, culpadas até que provem a sua inocência.
É a completa subversão da justiça de um Estado de Direito. À luz da lei do segredo de justiça, os jornalistas ficam impedidos de dar notícias de casos que estejam a ser investigados, prevendo a lei, para os casos de violação deste, várias sanções. Por que raio não se aplica esta lei? Vemos na TV os pseudo-isentos jornalistas, cumprido o seu papel, a abraçarem-se sorridentes, os prevaricadores impunes, a ganhar mais em publicidade do que qualquer campanha de marketing lhes permitiria, e não vemos as sanções a serem aplicadas. Afinal quem faz uivar a Justiça em Portugal?