Interessar-me por homens (eroticamente falando) seria mais fácil se eles fossem conversadores compulsivos, se tomassem as rédeas de um diálogo com pulso e me poupassem a trabalheira. Se não ficassem ali especados a olhar para mim com aquele sorrisinho que é sempre o mesmo e lhes está de certeza no código genético. Que quer dizer sempre o mesmo. Ai, o que o óbvio me irrita nem sei dizer! Não importa muito o que dissessem, desde que o proferissem com alguma noção de bom estilo narrativo e acima de tudo, desde que evitassem a todo o custo a ladainha lamecho-primária (acabei de inventar) sobre os meus atributos mais superficiais. Ouvi dizer que os há. E então se a amostra tiver por fonte a blogosfera, eu própria admito que eles são aos montes! Mas nunca se cruzaram comigo in persona. Ou então reservam os virtuosismos intelectuais em exclusividade para o mundo virtual. Ou então são exactamente esses que me ignoram ostensivamente. De qualquer forma, a conclusão é a mesma: a incompatibilidade parece ser incontornável.
Sexta-feira à noite, sofazando. O filho pródigo chega a casa e diz: "Que horror, cheira imenso a tabaco!", o que faz a mãe erguer-se de um salto para abrir as portas da sala, que dão para a varanda, de par em par (and did I mention it was 12ºC outside ??!!) De imediato entra uma varejeira nojenta que tenta a todo custo escapar da morte por hipotermia e é a minha vez de intervir com um sonoro "Fecha isso, caramba!", e para a gata: "Do something about it, you're the cat in the house!" Nada. Passados trinta segundos de nojo e ansiedade, finalmente uma reacção. A gata começa a emboscar o insecto asqueroso. "Ah! Até que enfim! Caça! Mata!" Cosmo, de volta ao sofá, diz: "I could have killed it. I may not be the cat in the house, but I have a pantufa."
E parabéns "mister" Scolari. Resisti até agora - e já lá vai quase um ano - a falar aqui abertamente sobre futebol, esgueirando-me do assunto com apenas três referências vagas. Pois chegou a hora de acabar com esse jejum e manifestar o meu franco apoio a Scolari como seleccionador da equipa principal de futebol profissional. É certo que ultimamente ele tem cedido aos nervos de formas bastante infelizes, mas também tem sofrido as consequências inerentes. Mas mais do que as consequências expectáveis, têm também sofrido o ataque constante de um bando de abutres cegos pela ânsia de carniça, que não conseguem distinguir entre o que é justamente exigível e a perfeição. Facto é que o homem levou uma selecção de futebol ao título de campeões do mundo e outra diferente ao quarto lugar de idêntica competição. Haverá assim muitos outros treinadores de futebol que possam dizer o mesmo de si próprios? Não me parece. Facto é que Scolari levou a nossa selecção a atingir classificações que esta quase nunca tinha atingido. Fomos muitas vezes vice-campeões europeus? E estivemos muitas vezes entre os quatro melhores do mundo? Não, pois não? Ontem, Scolari, como dirigente técnico máximo da selecção portuguesa de futebol, levou esta a mais uma qualificação para o Campeonato Europeu de Futebol em 2008. Cumpriu - mais uma vez - os objectivos. Portanto muito me espanta ver alguns - pronto, muitos - comentadores e jornalistas viciados em crítica cega quererem fazer disto algo parecido com um fracasso em toda a linha. É que essa gente parece estar muito convencida que tem poderes especiais de análise e que vê aquilo que Scolari não vê, e que tem muito a ensinar ao seleccionador sobre futebol em geral e como desempenhar as funções de seleccionador em particular. Treinadores de bancada, portanto. Mas falar da bancada, ou de um elegante estúdio de televisão, para analisar à lupa todo e qualquer defeitozinho, toda e qualquer falha, negligenciando ou mesmo ignorando os resultados, é que me parece uma análise muito parcial, pouco racional, nada justa, nada séria. Não sei o que tanto os excita no fracasso alheio. Mas suspeito ser o triste corolário que afirma que "misery loves company".
Tóquio é a cidade ideal para se estar deprimid@. Pressinto isto desde o Lost in Translation, essa obra cinematográfica discreta, magistral e demonstração plena do tal ideal. Em Londres e outras cidades cinzentas sente-se frio e outros desconfortos, mas também uma excitação cosmopolita que é antónima de depressão. Em Tóquio não se percebe nada do que se lê, não se compreendem os discursos, a cultura, os gestos. Mergulha-se na desorientação total e na procura desesperada de uma pista de sentido que nos oriente para um conforto minimal. Em Tóquio não se sente nada de positivo pela cidade, portanto não se tem pena de passar o dia todo encafuad@ num bom hotel. Há espaço de sobra para a depressão, amplo, digno e com estilo. Há também motivos e argumentos para side effects como o escárnio, o choro, o desprezo, a auto-comiseração e a apatia. E nem precisa de estar a chover. Aquele manto de poluição entre nós e o céu serve lindamente. Alguém tem um bilhetinho de avião a mais?
Obrigada pelo seu Curriculum Vitae, que teve a amabilidade de enviar para o endereço de e-mail geral desta empresa e que já foi - estou certa - parar ao recycle bin da maioria dos meus colegas, apesar de ter chegado somente há dez segundos.
Eu, não tendo nada melhor para fazer e movida por uma compaixão idiota própria de quem já se viu na sua triste condição, decidi responder-lhe, só para saber que, contra todas as expectativas e demonstrações científicas, é possível obter alguma espécie de eco desse buraco negro no ciberespaço exclusivamente dedicado à procura de emprego.
Infelizmente este eco não é aquele que tão ansiosamente aguarda. Desculpe mas não está nas minhas mãos. No entanto, não deixa de ser um eco. Fica agora à sua consideração decidir se prefere o silêncio habitual.
Se assim for, pelo menos - traumatizado pela minha missiva - não deixará de reformular o excerto do seu discurso que versa sobre o seu alegado "conhecimento de que a Vossa empresa está em franca expansão (...)".
Eu própria, a certa altura, reconheci quão patética era a minha atitude de lambe-botas e deixei de tentar cair nas boas graças dos departamentos de recursos humanos das empresas a quem enviava CVs dizendo que elas estavam a ir de vento em popa e eram muito promissoras.
Passei antes a dizer-lhes, no primeiro parágrafo das cartas de apresentação, que me estava a cagar para o que faziam ou em que parte do ciclo económico se encontravam mas achava uma certa graça a esta palermice de tentar parecer muito competente em duas páginas falando de mim própria na terceira pessoa, tendo ao mesmo tempo muito cuidado com a sintaxe e a ortografia.
Estranhamente isto captou inusitado interesse em alguns círculos restritos de funcionários acometidos por um tédio brutal, que tiveram a gentileza de me recomendar nas mais altas instâncias do submundo empresarial. E aqui estou eu. Temos que ser uns para os outros.
... em que a realidade não é conciliável com a actualização regular do blog. Esta seguirá dentro de momentos, que podem ser mais ou menos longos. Mas para não vos deixar completamente a seco, querid@s leitor@s, recomendo uma visita atenta a dois blogs: Blindness, da autoria de Fernando Meirelles, realizador de filmes como "A Cidade de Deus" e "The Constant Gardener". Este blog é um diário das filmagens da sua nova longa-metragem, baseada no livro de José Saramago "Ensaio Sobre a Cegueira". Muitíssimo interessante.
Outro é o blog de Lucía Etxebarría, Una Blog Como Otra Cualquiera... . Para quem, como eu, é fã desta escritora espanhola. Quem não é ou não conhece, pode ter sempre a abertura de espírito necessária para se deixar surpreender.
... e também, como não podia deixar de ser, às mulheres boas, e a todos os politicamente correctos, independentemente do sexo, credo, etnia, raça, orientação sexual, et cetera. Para vós, um lindo momento de poesia da boa:
Algumas perguntas a um “homem bom”
Bom, mas para quê? Sim, não és venal, mas o raio Que sobre a casa cai também Não é venal. Nunca renegas o que disseste. Mas que disseste? És de boa fé, dás a tua opinião. Que opinião?
Tens coragem. Contra quem? És cheio de sabedoria. Para quem? Não olhas aos teus interesses. Aos de quem olhas? És um bom amigo. Sê-lo-ás do bom povo?
Escuta pois: nós sabemos Que és nosso inimigo. Por isso vamos Encostar-te ao paredão. Mas em consideração Dos teus méritos e das tuas boas qualidades Escolhemos um bom paredão e vamos fuzilar-te com Boas balas atiradas por bons fuzis e enterrar-te com Uma boa pá debaixo da terra boa.
(Bertolt Brecht)
E ainda, porque um é pouco e dois é bom, parece:
O Analfabeto Político
O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo da vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguer, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado e o pior de todos os bandidos: O político vigarista, pelintra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.
(Bertolt Brecht)
Gostaram? Eu sei que sim. De nada, sempre às ordens.