Ontem ao almoço, numa tasca onde vou frequentemente, pedi bacalhau com grão.
Essa tasca tem um aspecto um bocado para o nojento, mas em termos de qualidade da comida não é melhor nem pior do que qualquer outro sítio aqui nas redondezas do meu emprego.
Tem é uns empregados mais simpáticos, independentemente de o seu aspecto condizer com o da tasca.
Apesar de serem nitidamente pessoas humildes, que se esfalfam ali diariamente a trabalhar, não dizem palavrões à frente dos clientes e são até muito educados, atenciosos e sorridentes.
O local é frequentado por trabalhadores da construção civil, assim como por agentes de seguros, pessoal administrativo e quem mais lá calhar.
Pois bem: no meio do grão vinha um berlinde. Uma bolinha de vidro transparente do tamanho de um grão.
Quando eu a mostrei ao empregado ele nem queria acreditar. Ficou aflitíssimo, desfez-se em desculpas e depois de indagar, veio explicar-me que aquilo tinha vindo na lata do grão. E eu acreditei.
De facto, não havia razão nenhuma para me mentir e o objecto não era nada que se parecesse com uma peça de um colar (a esfera não estava furada) nem parte de um anel (não havia sinais de incrustação) nem nada que pudesse ter caído da roupa de alguma das cozinheiras, que são duas e usam toucas e batas brancas de trabalho sem qualquer adereço.
Hoje voltei lá para almoçar. E vou voltar muito mais vezes. Em rigor, claro que não devia. Em rigor, devia fazer valer os meus direitos de consumidora, apresentar uma queixa formal, para que esses senhores encapuzados e armados até aos dentes com uns coletes à prova de bala que têm nas costas as letras ASAE escritas, fossem lá assustar os clientes e fechar ou multar o estabelecimento.
Mas quem é que ia sofrer com isso? A empresa responsável pela embalagem do grão, ou aquele homem (que se farta de trabalhar e é com toda a certeza mal pago – bem paga é a minha mulher a dias!), que me disse com orgulho de bom aluno: “Sabe, doutora, ainda ontem nós estivemos num curso de higiene-e-essas-coisas-no-trabalho, em que eles falavam sobre isto!”?
Neste país, quem se lixa é o mexilhão. Eu toda a minha vida fui mexilhão. Sei o que é. Não vou fazer queixa. Não lhes vou exigir que a formalizem, embora acredite que o façam ou que tentem fazer.
É muito fácil gritar aos quatro ventos que se o consumidor não exigir qualidade nunca a terá, e que o consumidor deve lutar pelos seus direitos, e isso é tudo verdade em teoria. Mas também é verdade que o exemplo deve vir de quem está em melhores condições para o dar, e não é nada disso que acontece na prática. E enquanto for assim, a qualidade neste país será apenas um mito.
Essa é uma guerra que há-de continuar a ser minha.
E quanto mais próximas de mim as vítimas, pior para os prevaricadores miticamente imunes.
No silêncio, pode não haver fumo, mas o fogo fervilha nas entranhas.
Temos de acabar com essa triste fama do mexilhão. A de se encolher.
Beijo saudoso.
Querida Nnanna,
Eu sou pela união "mexilhoeira" contra os abusos dos "tubarões". Unidos venceremos! Chama-me comuna :-)
Saudades também, muitas! Beijinhos!
De
duca a 24 de Setembro de 2007
Se viesses almoçar comigo à Jacinta, nada disso acontecia ...
Não preciso convidar, pois não? 
Beijo
De Rita a 24 de Setembro de 2007
A mim, a coisa mais curiosa que me calhou num prato foi parte da varinha mágica... também protestei e acho que consegui uma redução no preço. O certo é que uma varinha mágica não me faz muito nojo... Também já tive um bocado de celofane, num restaurante todo chique. Aí os protestos foram mais fortes e não paguei de todo o prato. Mas juro que não ando a levar estas coisas comigo para os restaurantes, heim!
Sabes que o Ary fez uma vez - antes do 25 de Abril - um slogan para a pescanova ou afins que era "Pescadinhas de todos os mares, uni-vos!"? E passou a censura!
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