Eu teria dito logo "apologia do mau carácter", isto segundo a ordem de valores católica apostólica romana mas depois reconsiderei porque este texto trata precisamente de fugir aos juízos de valor.
Eu pergunto: devemos ser bons porquê? E principalmente, devemos ser bons de acordo com a avaliação de quem? O que é que há de bom nisso, a não ser para aqueles para quem somos bons?
A recompensa divina? A evolução pessoal? Olhe que não, car@ leitor@, olhe que não. Na verdade, o prémio da sabedoria só se concretiza se formos suficientemente inteligentes para não cair na esparrela de dar a outra face. Se a oferecermos, é porque não aprendemos nada com a primeira chapada.
A falácia é a seguinte: quando nos incitam a sermos bons, o que na verdade querem é que sejamos bons para eles. Para eles. Se daí advier algo de positivo para nós, tanto melhor. Se não, paciência.
Os exemplos começam antes mesmo de se aprender a andar na posição erecta. Se uma criança faz uma birra porque não gosta da sopa, os pais incitam-na a ser boazinha e a comer a sopa toda, mas para quem é que isso é bom na verdade? Exacto, para os pais. Para os pais se sentirem de consciência tranquila em relação à quantidade de ferro e fibras que a criança ingere, para se sentirem bem consigo próprios na qualidade de "bons" pais. Por outro lado, a manobra de incutir na criança a ideia que fazer birras é ser mau e não fazer birras é ser bom menino / boa menina constitui uma óbvia contribuição para o bem estar, livre de mialgias, dos pais. E para a criança, será bom? Será mesmo bom obrigá-la a comer aquela papa asquerosa e ainda por cima reprimir os seus sentimentos e minar a sua auto-estima com culpabilizações de valor?
Outro exemplo: Porque é que a empatia se estabelece num encontro fortuito? É muito simples: porque alguém disse algo que gostámos de ouvir e assim se estabeleceu uma preferência decorrente da identificação com o outro, identificação essa que é potencialmente boa para o nosso ego, porquanto valida a nossa filosofia de vida e a nossa auto-estima, sem no entanto dizer praticamente nada sobre a suposta "bondade" do outro. Na verdade, o mais comum é dizermos sobre alguém que nos contestou/confrontou: "este gajo/a é um/a anormal/idiota/paspalho, palhaço/... (inserir insulto ou desdém que melhor vos aprouver), ou pelo contrário "que ser fantástico/maravilhoso/impecável/inteligente" sobre alguém que corroborou sistemáticamente as nossas teorias/posições.
Resumindo: a prática do bem em prol dos outros traduz-se, regra geral, numa manobra de auto-valorização - se esse bem for validado pelo reconhecimento - ou num penoso desperdício de energia - se não for.
Assim, o egoísmo como atitude anti-hipócrita de fazer o bem assumidamente por nós próprios consiste na fórmula inata mais eficaz de bem estar pessoal e não impede que o indivíduo seja solidário e tenha princípios éticos. Apenas evita que seja um totó errando pela vida com achaques de pundonor.
Agora, @ leitor@ pode cair na tentação de achar que, por ler este texto, já sabe algo sobre mim. Desengane-se. Eu não sou egoísta. Eu escrevi isto por me acontecer amiúde simpatizar com grandes putas dissimuladas e cabrões contestatários.
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